Andrea Lee Fonseca nasceu
em Toronto no Canadá, filha de pai canadiano e mãe portuguesa.
Para uma luso-portuguesa
que se expressa pouquíssimo na língua de origem da sua progenitora,
Andrea, embora provavelmente sem o saber, de forma misteriosa,
traz-nos por intermédio da arte de fotografar uma das mais belas e
sublimes formas de lusitanidade que temos contemplado ultimamente.
Sem talvez nunca ter
sabido que o território que é hoje Portugal, foi apelidado pelos
gregos do primeiro milénio antes de Cristo de ophiussa, ou
terra das serpentes (devido ao culto da serpente que seus habitantes
veneravam, culto este, dedicado desde o alvor da humanidade à Deusa
Mãe Terra), exibe esta
no
seu portfólio,
um
reduzido mas excelente conjunto de fotografias onde com magnifica
sensibilidade lusitana, nos
dá o prazer de revisitar essa
relação
tão
intrínseca entre a mulher e a natureza - beleza da mulher e a beleza natural. Relação esta, consubstanciada em algumas das suas fotografias, onde a mulher é abraçada e absorvida
por luxuriante vegetação e, noutras,
como por milagre, o movimento feminino é captado
pela câmara de forma irradiante, espalhando-se e fornecendo vida ao imobilismo
circundante.
Mais é de espantar, que
no seu sítio internetino, na zona do perfil, Andrea dá-nos a
conhecer a sua admiração pelo biólogo, teorista e conservacionista
Edward O. Wilson.
Para quem desconhece a
obra deste cientista, bastará uma curta visita à Wikipédia e logo
lhe surgirá dois registos de notável informação:
"The evolutionary
epic," Wilson wrote in his book On Human Nature, "is
probably the best myth we will ever have." Wilson's intended
usage of the word "myth" does not denote falsehood -
rather, a grand narrative that provides people with placement in
time—a meaningful placement that celebrates extraordinary moments
of shared heritage. Wilson was not the first to use the term, but his
fame prompted its usage as the morphed phrase epic of evolution".
Edward O. Wilson |
e ainda como comentário:
Cosmologist Brian
Swimme concludes in a 1997 interview
“I think that what
E. O. Wilson is trying to suggest is that to be fully human, a person
has to see that life has a heroic dimension (...) I think for the
scientist, and for other people, it's a question of "is the
universe valuable? Is it sacred? Is it holy? Or is the human agenda
all that matters?" I just don't think we're that stupid to
continue in a way that continues to destroy. I'm hopeful that the
Epic of Evolution will be yet another strategy in our culture that
will lead our consciousness out of a very tight, human-centered
materialism”.
Não será necessário
ler estes pequenos trechos de informação com extrema atenção,
para denotarmos que o E. O. Wilson proclama, não é mais do que
Leonardo Coimbra, Agostinho da Silva, António Quadros, Dalila P. da
Costa e a esmagadora maioria de filósofos e pensadores livres
ligados ao que ficou conhecido como o movimento da filosofia
portuguesa, sempre defenderam durante todo o séc. XX, com
continuação por outros no XXI. Movimento filosófico este, ainda hoje negado
de modo bafiento por sinistros e obscuros neo-mecanicistas nacionais.
Nos nossos dias, os menos
avisados, continuam a dar-nos pateticamente razões científicas para
a impossibilidade da ocorrência do milagre de Ourique e outros ,
confundindo puerilmente, a diferença existente entre ciência e
verdade, entre ideologia e crença e seu distinto movimento. Mas
este assunto ficará para uma outra altura..
Explicando o que é a xenophilia em suas palavras, diz-nos Andrea:
"Xenophilia, love of what is foreign, is an exploration of our place in nature and the mixed messages we are exposed to about our separateness and unity with the natural world. Through a journey, from belonging, to awareness of difference, to reintegration, this series concludes that we can only be what we are in relation to how we define what we are a part of".
mais ainda
"We belong to the natural world. From our inflated sense of having arrived at some pinnacle of evolution, we have lost the sense of belonging that is our biological heritage. We have accepted this false separation and have been wrenched from the forest. Yet all of life is part of us. We cannot be separated and it is only upon our return to this place that we can recapture this truth of belonging to something, everything, and become part of a much greater world".
Embora escrito em inglês, mas de forma tão lusitana no feminino, esta luso-canadiana transporta na sua relação com a arte de fotografar e na sua visão cósmica do mundo, essa mesma relação que podemos ler nas obras da saudosa e recentemente falecida Dalila Pereira da Costa por intermédio da palavra. Essa relação una, inconsútil da mulher lusitana com a terra. Tendo como paralelo no masculino, o conhece-te a ti mesmo, proclamado desde tempos imemoriais e abraçado pelos filósofos desde o séc. VIII ac. Preceito este, infelizmente quebrado em Portugal de forma extemporânea por Marquês de Pombal e Padre Luis A. Verney no séc. XVIII, que obteve como devastador resultado, a imitação em termos totalitários por parte dos portugueses, desse comportamento macaqueador face a toda e qualquer moda ou ideologia estrangeira.
Estamos pois face a uma fotografa luso descendente, e também perante uma fascinante
descoberta. Sobretudo se tivermos em atenção que a tendência de
ordenação religiosa em terras canadianas tal como nas dos Estados
Unidos, não se predica no culto da Deusa Mãe, mas sim no que
um cristão apelidaria de Espírito Santo. Tendência esta, bem
manifestada no culto e na comiseração face ao divino por parte dos
povos autóctones, onde embora dado a conhecer por intermédio do
feminino, este apenas possui uma importância provedora, pois toda a
espiritualidade das tribos índias é dirigida ao grande Manitu, o
grande espírito que relaciona em perfeição os céus com a terra
tornando-os uno: - Avô, Grande Espírito. Não há outro a quem
rezamos. Vós mesmo e tudo o que vedes foi por Vós criado (Alce
Negro).
Não será também por
outro motivo, que se verifica uma desorientação religiosa tão
notável nos povos imigrantes que compõe a população norte
americana, e como tal, a sua gorgonina e destrutiva atitude face à
natureza propulsionada ainda hoje pelos escritos de Locke (hoje, com
corrupta mistura do idealismo alemão).
O que consideramos como
mais notável no trabalho desta artista, é o credível e honesto
espírito que relaciona pensamento e movimento. Defendendo o
pensamento epopeico de E. O. Wilson, Andrea coloca um movimento nas suas
imagens que para qualquer homem possuidor do peito ilustre
lusitano, facilmente relacionará não só a figura feminina como
a paisagem luxuriante, com as ondinas (de carne e osso) e a ilha dos
amores camoniana.
Digno de registo é
também, a diferença existente entre o espírito epopeico onde esta
artista nasceu e cresceu e o lusitano.
Esmagadormente
influenciado pelos Estados Unidos da América, o espírito epopeico
canadiano baseia-se em grande medida no do seu hercúleo vizinho.
Melville diz-nos no seu
Moby Dick, que o homem vai atrás do mal. E com o quê? Com o que é
Mal! Destroem-se ambos no mal, ficando no final o quê? O mal!
Por outro lado, na
epopeia lusitana, Camões diz-nos que homem que é homem, aquele que
possui o peito ilustre lusitano, vai até ao cabo do mundo.
Depois do adamastino reconhecimento de si próprio, prossegue sua
problemática viagem já não a descer mas subindo em direcção à
Índia. Diz-nos ainda o vate lusitano, que já depois de terem
levantado ancora da Índia, os nautas encontraram de forma misteriosa
a Ilha dos Amores.
Resumindo, homem que é
homem terá que ir à Índia (Dos fracos não reza a história).
Existe a ilha dos amores é certo. Mas isso... são negócios de Deus.
Ao observarmos as
fotografias de Andrea, verificamos com doce e matrimonial emoção,
que esta exprimiu por intermédio de sua arte, esse divino e puro
receptáculo arquetipal tão nobremente exposto pelos poetas e
filósofos lusos.
A sociedade canadiana,
possui alguns pontos em comum com a portuguesa, pois tanto numa como
noutra, predomina o consumismo estimulado por entidades financeiras.
No entanto, sendo portuguesa apenas pelo lado materno, não tendo
grande informação da mais alta cultura do país de sua mãe, não
possui conhecimento também de parte substancial dos mitos e crenças
negativistas que assolam hoje o nosso País e, que impossibilitam
outras artistas de expressarem a sua mais profunda lusitanidade no
feminino com esta beleza, procedendo sim, à imitação de movimentos
culturais estrangeiros, muitos deles de intelectualidade duvidosa.
Destarte, ao ligar sua
alma à arte, esta fabulosa artista demonstra a um País, que por
muita destruição que possa acontecer, por mais vermesinos ataques
que positivistas, tecnocratas e mecanocratas façam à sua própria
Pátria, ela vive e viverá onde estiver um português ou seus
descendentes. Porque a Pátria é misteriosa... e Eterna.